Millor Fernandes:


Jornalismo, por princípio, é oposição – oposição a tudo, inclusive à oposição. Ninguém deve ficar acima de qualquer suspeita; para o jornalista, não existem santos.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Eleições municipais do Rio: O resultado que temíamos (por Carmem Migueles)

O RESULTADO QUE TEMÍAMOS E O NOSSO DESAFIO COMO SOCIEDADE

Crivella e Freixo no segundo turno. Não era isso que todos os que optaram pelo voto útil temiam? Perdemos nas urnas? Ou perdemos outra coisa em outro lugar?

Os votos do Crivella com os do Freixo somados correspondem a 46,02% do total de votos validos. Se ambos fossem um só, ainda assim não se elegeriam no primeiro turno. Então, vamos aos números: O eleitorado carioca é de 4.898.044 pessoas. 1.189.187 (24,28%) dessas simplesmente não foram votar, pelas mais diferentes razões. Mas 3.708.857 (75,72%) foram. E desses, 2.313.232 não queriam nem Freixo, nem Crivella. Venceu a minoria. O voto dos dois somam 1.395.625. A maioria perdeu.

Mas por quê? Como é possível, em uma democracia, a maioria perder? Perder para quem?

Só há uma resposta: perder para si mesma! A maioria dos eleitores cariocas perderam para si mesmos.

Vamos as causas possíveis para esse fato? Só parando para refletir sobre os erros podemos corrigi-los. E já está na hora. Não são já 29 anos do mesmo resultado, desde o fim da ditadura? Há aqui uma lei cármica: há uma relação de causa e consequência que se não alterarmos, não alteraremos os resultados.

Falhamos por que nos omitimos em refletir sobre aos valores que nos unem. Falhamos porque nos omitimos em pensar juntos sobre o projeto de sociedade que queremos.

Falhamos por que aceitamos o fatalismo: “sempre foi assim, não há nada a fazer”, “o povo brasileiro vota mal, carioca vota mal”! E no isolamento de cada um nos condenamos a omissão. Ao fazer isso, perdemos todas as oportunidades de mudança!

Mas nos omitimos como? O que poderíamos ter feito? Poderíamos ter, todos, trabalhado mais diretamente na educação uns dos outros.

Poderíamos ter trabalhando mais fortemente na influência em todos os lugares onde convivemos. Poderíamos ter participado mais, nos engajado mais. Não estou criticando os outros, mas pensando também sobre mim mesma. Entrei para o Novo em abril. Até então eu também só olhava de longe. Mas quando falo em engajamento, não é só em um projeto partidário. Mas em um debate sobre valores.

Porque rejeitamos Crivella e Freixo? Porque, para nós, Crivella corresponde ao retorno ao populismo, à dispersão de recursos sem estratégia, ao assistencialismo, que tanto mal já fez ao Rio. E ao Freixo? Porque é um discurso que infelizmente não tem foco. Um discurso vago e remoto em defesa de minorias que não teriam os problemas que ele aponta se a sociedade simplesmente se organizasse para que a lei valesse. Alguém é a favor do machismo que mata? Da homofobia? Da morte dos pobres pela violência? A enorme, esmagadora maioria, não é! Há leis contra isso. Mas não há capacidade de investigação, não há mecanismos de punição adequados. O seu discurso tenta criar o sentimento de perseguição desses grupos pela maioria da sociedade. Mas esse discurso é falso. Divide para atrair para si o papel de salvador desses oprimidos. Mas esses não são os oprimidos de fato e o discurso de divisão não encaminha para a solução. Afasta dela. Porque é vazio e não traz em si analises que permitam resolver os problemas que aponta.

Enquanto isso, na vida real, fora das universidades e dos jovens buscando causas, a grande maioria das mães pobres pagam uma quantidade indecente de impostos sobre o consumo. Dividem com o estado inchado, ineficiente, o pouco que tem para colocar comida na mesa de suas crianças. E não recebem nada em troca. Sem suporte para trabalhar e sobrecarregadas por impostos e tarefas, não conseguem cuidar de suas crianças. Que acabam vítimas de todos os tipos de violência: física, sexual, psicológica. Sem alternativas e revoltadas, algumas entram para o crime. Passam a vender drogas, vendem crack.... e transformam outras pessoas com história similar em vítimas da dependência. Somos uma sociedade cruel, que vira às costas para essas pessoas. Que não foram representadas na campanha nem pelo discurso da populista nem pelo discurso da esquerda das minorias aborrecidas.

Nos omitimos, e perderemos a chance de apoiar o empreendedorismo que nos ajudaria a retomar a rota da prosperidade, por um lado, e da solidariedade com quem realmente precisa, por outro.

Solidariedade essa que demanda muita competência e foco em gestão para que os problemas de fato sejam resolvidos. Mas não precisamos perder a lição: ou participamos com mais vontade, ou continuaremos perdendo para nós mesmos. Um amigo brinca falando do Rio.... diz: o problema é muito malandro para pouco otário.... é malandro dando volta em malandro. A malandragem aqui dá pouco resultado!


Pois é: o grande caminho não é o da malandragem. O do jeitinho. Mas sim o do Jeitão: que é parar, refletir e se engajar em fazer a coisa certa e do jeito certo. Vamos fazer isso?

Vamos começar hoje? Quatro anos não é muito para mudar tantos anos de hábito de pensamento e ação que nos trouxeram até aqui!

Vamos juntos? Hoje volto para o trabalho. Dou adeus às eleições. Acho que abri um espaço para outros cidadãos comuns, que nunca foram políticos, tentarem fazer a diferença. Eu vou ajudar de fora: na tarefa educativa de expansão das consciências. Vamos criar as precondições para eleger quem nos represente em 2020? Eu, daqui, vou fazer a minha parte!


Carmem Migueles é funcionária e gestora pública e foi candidata à prefeitura do Rio pelo partido NOVO

(Nota do Blog) Nas eleições de 2014 o resultado final do segundo turno mostrava que a maioria dos eleitores rejeitavam os dois candidatos. Se pegássemos os 30% de abstenções e somássemos aos votos do candidato rival os dois perderiam.

Nas eleições municipais de 2016 o resultado final mostra que 46% do eleitorado rejeitou todos os candidatos a prefeito.

Significa dizer que as abstenções foram maiores que a maior votação qualificada para o segundo turno. Se eu dizia que em 2014 a maioria do pais rejeitou Dilma e Aécio.  Em 2016 posso dizer com segurança que o Rio rejeitou todos os candidatos, e que esse segundo turno entre Crivella e Freixo é uma ANOMALIA, UMA FRAUDE rejeitada por 46% da população carioca em um pais onde o voto não é opcional, é OBRIGATÓRIO.

Nossa democracia de barro nos brinda com esse direito compulsório de escolher o método de abate. Se queremos uma morte lenta na cruz do populismo, ou uma morte fulminante na foice da ideologia cega.



"O preço a pagar pela tua não participação na política é seres governado por quem é inferior." Platão

Um comentário:

  1. Ótimo artigo e ótima nota. Creio que Freixo perdeu porque os eleitores não acreditaram na versão light que ele tentou vender durante toda a campanha - seria impossível identificá-lo como um socialista por ela.

    Sem dúvida, há um vazio político no eleitorado carioca. Se algum empresário (como o Doria) tivesse se candidatado, teria boas chances.

    ResponderExcluir

Recomenda-se ao comentarista que submeta seu texto a um corretor ortográfico.

Pede-se o uso de parágrafo, acrescentando-se um espaço entre uma linha e outra.

O blog deletará texto só com letras MAIÚSCULAS.


"Se a prudência da reserva e decoro indica o silenciar em algumas circunstâncias, em outras, uma prudência de uma ordem maior pode justificar a atitude de dizer o que pensamos." - (Edmund Burke)